28.2.22

“a vida continua”

Esta é uma frase dos últimos tempos. E muito utilizada por pessoas que decidiram “misturar” publicações, nas redes sociais, de compaixão com os ucranianos ao mesmo tempo que promovem umas cuecas novas e um creme excelente para curar a comichão no cotovelo esquerdo nos dias ímpares do mês. É verdade, a vida continua.

Só não continua para os civis, crianças incluídas, que perderam a vida nesta guerra estúpida. Nem para os soldados que morreram a disputar uma guerra que não é sua. Nem para todas as pessoas que morrem.

É verdade, a vida continua.

Continua para os ucranianos que estão a fugir do seu país e a abandonar as suas casas.
Continua para pais que se despedem, sem saber se é a última vez, de filhos e mulheres.
Tal como continua quando morre um ente que nos é querido.
Continua quando morre um animal de estimação que foi o companheiro de uma vida.
Continua quando somos despedidos e nos vemos sem rendimentos e contas para pagar.
Continua quando somos atacados por uma doença mais ou menos grave.

E podia passar horas nisto. Porque, afinal de contas, a vida continua. Se ninguém morreu, a vida irá continuar para essas pessoas.

A vida continua. Nós continuamos com ela. Mas mudamos. Porque é normal. Não espero felicidade de quem passou ou está a passar por uma situação complicada. Não espero sorrisos de quem perdeu um pai. Não espero grandes manifestações sociais de quem está na merda.

E mesmo quem “vive” das redes sociais e das publicidades não será a mesma pessoa quando tudo está mal. E não estou a falar de uma guerra a uns países de distância. Falo de problemas que estão à distância de um braço. Estas pessoas serão diferentes porque a vida obrigará a que o sejam. E é isto que condeno. Utilizar a situação da Ucrânia para ter mais uns likes. Porque é uma hashtag que é tendência. Porque está na moda. Porque é cool mostrar compaixão. Porque as marcas vão adorar este meu lado.

A vida continua. Irá sempre continuar. Mesmo nos dias em que nos apropriamos da dor dos outros porque vamos ter mais 100 likes. Ninguém é obrigado a mostrar compaixão em relação à Ucrânia apenas porque sim. A vida continua. Mas existem momentos que pedem que sejamos diferentes. Só isso.

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