20.1.15

a queda do mito que leva à ascensão da realidade

Ao longo dos últimos dias perguntei a diversas pessoas qual a imagem e a primeira ideia que associam a uma cozinha de uma cadeia de supermercados/hipermercados que confeccione comida para vender nas suas lojas num registo Take Away. Depois, pesquisei diversas notícias sobre as referidas cozinhas de modo a analisar as opiniões que eventualmente pudessem ter sido reveladas em forma de comentário. Confesso que não fiquei surpreendido com as respostas. De um modo geral as pessoas associam a pouca qualidade dos ingredientes às respectivas cozinhas. Há quem acredite que são utilizados produtos prestes a expirar o prazo de validade. Depois, existem os que questionam a higiene do local e dos próprios funcionários. Existem ainda aqueles que acreditam que o local de trabalho é uma pequena bagunça onde todos se misturam e onde cada qual faz uma tarefa necessária naquele momento. A verdade é que tudo isto não passa de um mito. Pelo menos na cozinha central do Pingo Doce, situada em Odivelas e que fui convidado a conhecer.

Primeiro, saliento que, para quem não sabe, é neste local que é confeccionada a comida que as lojas Pingo Doce (de Coimbra para baixo) vendem nos seus espaços Take Away, que são a grande aposta da cadeia. E é neste mesmo espaço que são feitas as sopas que podem ser encontradas em todas as lojas Pingo Doce, com excepção a três sopas – entre elas a afamada Sopa de Peixe – que são feitas em Aveiro. Se tivesse que resumir a realidade que encontrei – e que desconhecia por completo – numa frase diria que aquela cozinha é um relógio suíço e que cada um dos 160 funcionários que lá trabalham são uma peça fundamental para o perfeito funcionamento daqueles seis mil metros quadrados. E também que é uma orquestra que funciona a uma só voz e onde cada som que eventualmente tenha lugar fora do sítio é analisado à exaustão de modo a que se perceba o que se passou. A cada passo da visita desconstruí os mitos que fui ouvindo.

Começando pela higiene que muitos questionam. Cada funcionário tem direito a sete fardas. Que não são levadas para casa. Ao final do dia, são depositadas num local próprio para que uma empresa, que é a detentora das mesmas, faça a higienização de modo adequado. Por sua vez, as fardas têm um chip que permitem que seja associada a um funcionário que, no momento de entrar ao serviço tem a farda limpa ao seu dispor, pronta a vestir. Isto impede que uns tenham as fardas mais limpas do que outros, por exemplo. Tal como certifica que cada uma das fardas foi limpa da forma adequada e desejada. Antes de entrarem no relógio suíço, leia-se cozinha, os funcionários submetem-se a um outro processo de higienização que vai dos pés a tudo o resto. Imaginem uma daquelas máquinas de lavagem automóvel onde a viatura passa por uma série de processos. É semelhante. A partir daqui, e sem hora marcada, ouve-se uma voz que lembra os funcionários que está no momento de lavar as mãos. Todos param e todos cumprem a regra sem que seja necessário utilizar as mãos para abrir/fechar a torneira. Outro dado de relevo. Nenhum funcionário abandona o local de trabalho para ir ao lixo, por exemplo. O material que já não faz falta é colocado num determinado local onde é recolhido por uma empresa exterior que tem como única missão recolher aquilo que está a mais na cozinha. Posso ainda acrescentar que esta cozinha tem um sistema que aproveita o vapor produzido para tudo e mais alguma coisa. Assim, torna-se mais sustentável do ponto de vista energético e um dos aproveitamentos de vapor é para que grande parte da cozinha se lave de forma automática sem colocar em risco a contaminação dos alimentos. E assim está destruído o mito da falta de higiene. Se há coisa que é indispensável é a higiene.

Quem questiona a qualidade dos produtos utilizados provavelmente ficaria boquiaberto com a qualidade dos produtos utilizados para a confecção das refeições que vão ser comercializados na secção Take Away. Posso garantir, porque vi, que são utilizados os melhores produtos. Um dos mitos que muito se ouvem é de que as sopas, para dar apenas um exemplo, são feitas com “pós” milagrosos. Mais um mito que cai por terra porque as sopas são feitas com os mesmo ingredientes de qualquer sopa caseira. Nem mais nem menos. Os mesmos a que qualquer pessoa recorre quando quer comer uma boa sopa caseira. Ainda sobre os ingredientes existe algo que vejo como um exemplo que já valeu um prémio à cadeia. Como muitas pessoas sabem, existem ingredientes que não cumprem os requisitos necessários para que possam ser vendidos no retalho. Por exemplo, uma courgette com uma curva mais acentuada que ninguém vai querer levar de uma loja. Por outras palavras, são os ingredientes feios, que os fornecedores acabam por não poder vender. Estes são aproveitados pela cozinha Pingo Doce. A qualidade é a mesma. O sabor é o mesmo. Só muda o efeito visual que não tem qualquer valor quando vai ser triturado para uma sopa, por exemplo. Fiquei a saber que os mesmos têm uma presença cada vez maior na cozinha Pingo Doce, ultrapassando e bem, uma tonelada.

Esquecendo as sopas e passando aos outros pratos. Quem imaginar um guião de um filme imagina uma receita que é confeccionada na cozinha de Odivelas. Ou seja, existe uma receita que é cumprida à risca pelos cozinheiros de serviço, tal como um actor segue as falas do guião. Qual a lógica disto? Fazer com que a pessoa que coma um prato em Coimbra sinta o mesmo sabor quando o comer no Algarve. Se são feitos no mesmo local, têm de saber ao mesmo. Este processo permite que isso aconteça. Além disso impede coisas de que as pessoas só se lembram no momento da compra como num dia o caldo verde ter três rodelas de chouriço e noutro dia quatro. Este processo rigoroso impede situações destas. Mas é apenas um dos processos. Outro bastante importante é a conservação a frio. Assim que acabadas de fazer, as refeições são submetidas a um processo de arrefecimento até à temperatura de 3ºC. Existem aparelhos próprios para isto que têm programas que funcionam por igual para cada um dos pratos elaborados. Mais uma vez, assim toda a comida é tratada por igual com tecnologias que permitem manter o sabor e qualidade originais dos produtos utilizados. Um dado importante é que em nenhum momento deste processo são utilizados conservantes. Resumindo, as refeições vão ser aquecidas uma única vez, pelo cliente no momento do consumo.

Ainda sobre as refeições disponíveis das lojas. Fiquei a saber que existe uma sopa que foi feita porque apenas um cliente, que se assumiu como assíduo na reclamação, considerou não ser admissível não comer a determinada sopa nas lojas. Existem outras receitas que foram sugeridas pelo chef executivo Vítor Esteves. E ainda algumas que foram sugeridas pelos próprios funcionários, quer seja através de concurso ou mesmo por iniciativa individual. Depois, existe o mito de que tudo é vendido na loja. Mais uma ideia errada. A comida tem mínimos olímpicos. Ou seja, se uma sopa, por exemplo, não tiver um determinado peso, não vai para a loja. É automaticamente colocada de parte e dada a uma instituição. Outro dado curioso em relação a cada um dos pratos elaborados diariamente. Existe uma espécie de bilhete de identidade associado ao mesmo. Isto permite que seja possível saber o que aconteceu em cada momento da elaboração e quem foi o funcionário responsável pelo passo. Além disso, é guardada (durante dez dias) parte da comida elaborada. Em caso de problema ou queixa isto permite que seja efectuada uma análise, por exemplo pela ASAE, que permite descobrir se existe algum problema com a comida. Para que nada falhe existe um conjunto de pessoas que estão encarregues de um rigoroso (essencial e indispensável) controlo de qualidade.

E se tudo isto já é tratado de forma exemplar, como tive a possibilidade de testemunhar, fiquei a saber que o Pingo Doce, que tem o serviço Take Away disponível em 337 lojas, tem um serviço de encomendas personalizadas que está disponível actualmente em 33 lojas da área de Lisboa. Este serviço permite encomendar pratos diferentes daqueles feitos para as lojas e estas encomendas são tratadas, tal como o nome sugere, de forma personalizada e fora do circuito normal da cozinha. Dados curiosos da visita que efectuei às cozinhas: os portugueses consomem cada vez mais sopa. A venda de sopas aumentou substancialmente ao longo do último ano. Outro dado curioso, come-se mais sopa mas os portugueses não dispensam um mimo no final da refeição. Ou seja, as sobremesas também estão a subir nas vendas da cadeia. É de relevo que a cozinha esteja construída de forma a que as pessoas não se cruzem nas suas funções. Com isto quero dizer que ninguém atrapalha ninguém. Ninguém ocupa o espaço de ninguém e tudo corre de feição.

Após esta visita senti-me um privilegiado. Porque considero que todas as pessoas deveriam ter a oportunidade de observar a realidade que conheci. Assim percebem que as histórias que ouvem não passam de mitos. E depois de uma visita destas não teriam qualquer problema em comprar comida para levar para casa no Pingo Doce tendo a certeza de que o preço atractivo não significa que tenham sido ignorados os mais importantes passos associados à qualidade na sua confecção. Tinham a certeza de que as refeições foram elaboradas com os mesmos ingredientes que se utilizam em casa e que foram sujeitas a um rigoroso processo onde nada falha no que diz respeito à qualidade e higiene. Por fim, partilho uma história que foi contada pelo chef executivo Vítor Esteves que deu um jantar em casa onde serviu uma sopa de peixe que fez as delícias dos convidados. Sendo chef de profissão, todos quiseram saber a receita secreta da sua maravilhosa sopa de peixe. “Qual o ingrediente secreto?”, perguntaram. “Queres a receita da sopa?”, disse o chef. “Passa no Pingo Doce e compra uma que foi lá que a comprei e só aqueci antes de servir”, respondeu. Este episódio resume a ideia que as pessoas têm de uma realidade que desconhecem e que é feita de mitos injustificados.

28 comentários:

  1. Muito obrigada pelo esclarecimento tão pormenorizado, gostei bastante e aprendi bastantes coisas.

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    1. Como referi senti-me um privilegiado em conhecer esta realidade que muitas pessoas desconhecem, questionam e na qual não acreditam. Aquilo que partilho foi visto por mim. Não foi contado por ninguém.

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  2. Confesso que também eu, por ignorância, estaria do lado dos que achavam que a coisa não era assim muito rígida.
    Gosto quando percebo que estava errada e que o preconceito é mesmo coisa feia!
    Obrigada!

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    1. Acho que o ponto de destaque é mesmo esse. Existe o preconceito de que não existe higiene e qualidade. Preferi não escrever no texto mas posso partilhar que tenho a certeza de que muitas pessoas não consomem os produtos utilizados nas suas rotinas diárias. E acham que os mesmos não têm qualidade... E também são utilizados produtos Pingo Doce porque são realmente bons. Um exemplo disso é o do chocolate em que usam marca própria ou outra bastante conhecida. Acho que, como dizes, passa quase tudo pelo preconceito.

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  3. Uma excelente descrição da tua visita.
    Parabéns.
    Bom, nunca compro refeições no PD, porque cozinho eu as minhas refeições, mas já lancei, várias vezes, os olhos às sopas que costumam ter, aqui no supermercado perto de casa, e parecem-me boas.
    Lendo este teu post, fiquei convencida.
    Ah! Eu compro os produtos marca branca, neste caso, PD (na concorrência, o C, acho tudo muito mais caro, raramente compro alguma coisa).
    Um abraço.

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    1. Acho que os mitos criados desaparecem por completo quando se conhece a realidade.

      beijos

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  4. Estes sítios têm sempre imensos regulamentos e regras a cumprir, e acredito que as autoridades estejam sempre em cima deles. O mesmo se passa no MacDonalds. Muita gente pensa que lá dentro é tudo um nojo, mas eles também seguem tudo à regra.

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    1. Aposto que a maioria das pessoas ficaria surpreendida pela positiva com o que ia encontrar na cozinha.

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  5. Gosto muito de "o ler", mas desta vez esticou-se no post.
    Sorry mas desisti ao fim do 2ºparagrafo, não por culpa do tema, nem do texto.
    Mas devo estar extremamente cansada, hoje só textos "Take Away"

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    1. Podes tratar-me por tu, ok?

      Não sei se te referes a todos os textos que publiquei ontem, fazendo uma "comparação" ou se te referes a textos publicados noutros espaços. Posso dizer que não visitei a cozinha sozinho mas ontem ainda não tinha lido nenhum texto sobre a visita.

      Obrigado e espero que o cansaço se vá embora :)

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  6. Só faltou a foto reportagem :)
    Mas confesso que também pensava que era tudo mais descuidado e feito com produtos em fim de validade para aproveitamento dos mesmo.

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    1. Ainda não tenho as imagens que foram captadas comigo mas dentro da cozinha não são permitidas fotografias. Acredito que muitas pessoas pensam como tu porque essa é a mensagem que vai sendo transmitida. Mas a realidade é bem diferente.

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  7. Apesar de longo, parece-me um texto bem elucidativo, sem publicidade encapotada. Achei-o mesmo muito interessante. Melhor só mesmo se tivesse algumas fotos da visita. :)
    Marisa Ribeiro

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    1. Em relação às fotos, não são permitidas imagens dentro da cozinha. E esse é o único motivo pelo qual não existem imagens desse momento. Em relação ao que escrevi, não escondi que foi o Pingo Doce que me convidou (e a outras pessoas) a conhecer aquela realidade que muitos desconhecem. Mas isso não implica escrever coisas em que não acredito. Isso é algo que não sou capaz de fazer. Passei para palavras aquilo que descobri e que mostra que a forma de pensar da maioria das pessoas está errada porque são mitos que não passam disso mesmo :)

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    2. Pois, imaginei que não permitissem fotografias. Continuação de bons textos :)
      Marisa Ribeiro

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  8. Moro em Odivelas mesmo perto desse Pingo Doce a que se refere. Gosto muito da loja (que levou umas valentes obras há uns 4 ou 5 anos) e que ficou francamente muito melhor. Melhor na exposição dos produtos, melhor no pessoal e melhor na qualidade dos frescos. Em relação às refeições, confesso que só compro, e não muito habitualmente, o frango assado. E porquê? Precisamente porque nunca acreditei na relação qualidade/preço.
    Obrigada pelo testemunho, vou passar a olhar para a comida do Pingo Doce com outros olhos, apesar de recorrer à mesma só em casos muito excecionais.

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    1. A relação qualidade/preço é algo muito pessoal. Aquilo que pode ser uma boa relação para mim pode ser péssima para ti e vice-versa. Neste caso específico, o meu objectivo foi destruir os mitos de que não há higiene, de que os produtos não prestam, de que a validade está quase a expirar e por aí fora. Quer as pessoas acreditem ou não, a comida é feita com o máximo cuidado e com os mais elevados padrões de qualidade. Foi isso que vi e que tive a oportunidade de ler, num momento posterior à visita, em diversas reportagens que foram publicadas em algumas publicações.

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  9. Olá. Tendo participado na visita estou impressionado com o detalhe do post. Excelente descrição.

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  10. Para que faz parte deste projecto é um enorme orgulho ler estas palavras...:-)

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    1. Não referi nada que não tenha visto e acho que serve para que muitas pessoas esqueçam as ideias erradas que têm :)

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  11. Tive o prazer de visitar a cozinha há cerca de um ano e subscrevo por completo.
    Obrigado

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    1. Relatei a realidade que observei. Não exagerei em nada. Tentei não me esquecer daquilo que considero relevante tendo em conta a imagem que percebi que as pessoas tinham de um espaço do género. Se viste o mesmo do que eu é bom sinal.

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  12. Esta é daquelas questões que, para mim, só ver para crer.

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  13. O meu sonho era trabalhar nessa cozinha, relógio suiço... deve ser uma animação! Ridiculo...

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  14. Bem, eu ando a comer sopa de lá e acho boa, não me parece que seja muito diferente da de casa. :)

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