20.2.14

is this love? (capítulo quinze)


Alexandra tinha saído do consultório há aproximadamente meia hora. Mas não tinha rumado até casa. Continuava a deambular pelo jardim situado nas proximidades da clínica. Local onde tinha brincado, em pequena, algumas vezes com o seu pai nos dias em que a mãe tinha consulta. Irrequieta, não aguentava mais de dez minutos quieta e o jardim era a única solução que o pai encontrava. Apesar daquele espaço lhe trazer boas memórias, não se lembrava de nenhuma. Só pensava nas palavras da ginecologista.

Enquanto os alertas da médica ecoavam na sua cabeça pensava se estaria tudo bem consigo. Melhor, acreditava que tudo estava mal consigo. Desde tenra idade que Alexandra tinha a mania das doenças. Ao mínimo sintoma imaginava o final do mundo e da sua vida da forma mais trágica e cruel possível. Neste caso, o pânico era a dobrar. Temia por si e sobretudo pelo bebé. “E agora? O que vai ser de nós”, dizia vezes sem conta num tom de voz mais alto do que imaginava, o que fazia com que as pessoas do jardim olhassem para a mulher que não parava quieta enquanto falava sozinha.

Quase três horas depois do final da consulta chegou a casa. Assim que entrou, deu de caras com Miguel que olhava para si de forma assustada. “Será que se nota que tenho algum problema?”, pensou Alexandra, num dos típicos momentos em que era controlada pela mania das doenças. “Só agora? Já estava a ficar preocupado contigo. Está tudo bem?”, perguntou Miguel. “Só agora! Como assim?”, respondeu, não tendo a mínima noção de que a consulta já tinha terminado há muito. “Sim, a consulta não era às três? Já passa das seis. Estava preocupado”, disse.

Alexandra ficou mais aliviada e para esconder a sua mania das doenças optou por improvisar e mentir para se justificar. “Aquilo atrasou muito. Já estava farta de esperar. E a consulta foi muito demorada. Levei um raspanete porque não ia lá há muito”, referiu. “E está tudo bem com vocês?”, insistiu Miguel. “Sim. Mas como andava desleixada com as idas à ginecologista vou ter de fazer umas análises complementares. Amanhã trato disso”, disse Alexandra.

Miguel respirou de alívio. Já Alexandra, fazia os possíveis para esconder a sua faceta que dava a entender que tudo estaria mal. O resto do dia foi passado assim. Com Alexandra noutro planeta onde só existem doenças e mais doenças. Miguel dormiu praticamente a noite toda com a mão apoiada na barriga da namorada. Alexandra estava sempre a acordar por causa dos nervos e da ansiedade. Pouco passava das seis da manhã quando Miguel acordou com barulhos que ouvia.

Era Alexandra que já se despachava para fazer as análises. “Que estás a fazer a esta hora?”, perguntou Miguel. “Estou a despachar-me para ir para a clínica. Sabes que abre às oito e quero ser das primeiras para me despachar”, justificou. Miguel riu-se. “Mas ainda nem são sete horas e a clínica fica a dez minutos daqui”, acrescentou enquanto olhava para o relógio. “Anda deitar-te mais um pouco hipocondríaca. Ou deves pensar que não sei que estás toda nervosa com medo de que algo esteja mal”, disse. “Parvo!”, foi o que Alexandra disse enquanto atirava uma almofada para cima do namorado.

Vinte minutos depois da sete e Alexandra já estava à porta do posto. Tinha sido a primeira a chegar. Poucos minutos depois chegavam duas velhotas. “Bom dia menina! Também está com medo de que venha muita gente?”, perguntou uma dela. “Bom dia! É verdade. Quero despachar-me porque vai ser um dia muito comprido para mim”, respondeu, mentindo. “É pouco comum ver aqui meninas da sua idade a esta hora. Nós já somos clientes da casa, não é Alzira?”, disse, provocando um sorriso geral. “Daqui a pouco devem chegar mais pessoas mas tudo da nossa idade”, acrescentou. E assim foi.

Às oito já estava mais de uma dezena pessoas mais velhas à porta da clínica. Alexandra era a única da sua faixa etária. Mas dava-se por contente. Ia ser a primeira a ser atendida e isso era o que mais queria. Meia hora depois estava despachada. “Quando é que os resultados chegam?”, perguntou. “Assim que chegarem recebe uma mensagem para os vir levantar mas deve ser coisa de três dias, no máximo”, disse a funcionária.

As horas foram passando. Os nervos não se alteravam. “O que será que tenho? Nunca mais mandam a maldita mensagem”, disse para os seus botões, no próprio dia que tinha ido à clínica. O tempo foi passando. Nada mudava. Os mesmos nervos. As mesmas questões. Até que ao segundo dia o telemóvel tocou. “Chegaram os resultados dos seus exames. Pode passar na clínica para levantar os mesmos. Obrigado”, foi o que leu. Depois, foi a correr para a clínica.

Apesar de ter a mania das doenças, Alexandra era incapaz de ver os resultados dos exames e análises que fazia. Nem sequer tinha coragem de tentar ver se os valores estavam dentro do que é normal. Assim que saiu da clínica, ligou para a ginecologista. “Já tenho os resultados. Quando posso marcar a consulta?”, perguntou. “Foste rápida Xaninha. Ainda bem! Tive uma desistência e tenho vaga daqui a duas horas. Podes vir?”, disse. “Claro que sim. Até já.” Desligou o telemóvel foi logo para a clínica. Quando faltava uma hora e meia para a consulta.

“Já por aqui?”, perguntou a assistente. “Estava perto e não tinha nada para fazer”, respondeu, mentindo novamente. Até que chegou a sua vez. “Pode entrar agora”, foi o que ouviu. O seu coração batia mais rápido do que nunca. “Olá Xaninha! Tudo bem? Senta-te e mostra lá os resultados daquilo que te pedi”, acrescentou a médica. Num gesto extremamente rápido, Alexandra entregou o envelope à médica. Fitou os seus olhos enquanto fazia figas com as mãos escondidas do olhar da sua ginecologista.

“Ora bem. Deixa cá ver”, disse a médica com aquele ar característico dos médicos que observam resultados de exames à frente dos pacientes enquanto arrastam a voz. Alexandra respirava fundo. “Está tudo bem”, foi o que ouvi da médica, para seu alívio. “Mas a partir de agora não aceito desleixo nenhum. Combinado?”, perguntou. “Claro que sim. Pode ficar descansada”, disse Alexandra. À saída, fala com a Carla que te irá dizer quando tens de vir cá novamente. Alexandra assim o fez. Mas nem se lembra de o ter feito.

Já na rua, ligou a Miguel. “Já tive consulta e está tudo bem comigo e com o bebé”, disse com um enorme sorriso no rosto. “Ainda bem. Sei que deves ter ficado bastante nervosa. Agora relaxas. Até já, amo-te muito”, referiu Miguel. Mas Alexandra não relaxava. A dúvida que a consumia agora era outra. “Menino ou menina? Queria uma menina”, era aquilo em que pensava.

6 comentários:

  1. Chiça, que agora até aquele nervoso miudinho no estômago deu, mas ainda bem que "acabou" em bem!
    Ansiosamente à espera da continuação...
    Parabéns Bruno, és um senhor da escrita!

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  2. Publicas um capitulo de quanto em quanto tempo?

    Obrigado por mais um capitulo...

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    1. Quando o trabalho deixa, é um por semana. Sempre à quinta-feira. Dia em que é escrito, minutos antes de ser publicado.

      Obrigado pela simpatia.

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