um dia vou achar que estou louco. hoje é o dia.

Serei parvo? Louco? Mal-educado? Ou será que vivo num mundo só meu onde aquilo que considero normal é na realidade muito fora e aquilo que defendo ser patético é na realidade regra geral e aquilo que todos deviam fazer? Não sei... estou baralhado.

 

Enquanto jornalista tenho que ser desenrascado. Seja na procura de fontes para uma história, na elaboração de um artigo, na preparação para as entrevistas ou mesmo no local onde as faço.

 

Já entrevistei pessoas em carros, em bancos de jardim, na rua, em cafés, estúdios e em quase todos os locais que possam imaginar. A minha regra é apenas uma: que o convidado se sinta confortável para dialogar comigo e que o local seja do seu agrado. Posso estar desconfortável, mas eu não importo para nada. Quem manda é o convidado. Isso é que me interessa.

 

Hoje, calhou-me entrevistar uma pessoa numa esplanada com vista para o mar. Aquilo que tinha tudo para ser o final de tarde perfeito. Como a temperatura não era a melhor, optamos por falar no interior do bar, onde nos aquecemos com bebidas quentes que acompanharam a conversa. Estávamos apenas nós (eu e o entrevistado) e um casal mais velho, sendo que a mulher lia um livro em voz alta ao marido.

Além disto, a música tocava alto, como é normal nestes locais, e algo que o meu gravador felizmente consegue contornar. A conversa desenrolava-se de forma natural quando a senhora decidiu interromper a entrevista, de forma inesperada.

 

"Podem falar mais baixo. Estou a ler", disse, para meu espanto. É preciso uma grande lata e não ter vergonha na cara. Isso ou gostar de atrapalhar os outros. É verdade que a opção de entrevistar alguém numa esplanada foi minha e do convidado. Como tal, seria incapaz de pedir para baixarem a música ou exigir silêncio. Mas, como é que me podem pedir para falar mais baixo quando estão a falar muito mais alto do que eu e quando a música toca num tom ainda mais elevado do que as próprias vozes. Já para não referir que se trata de um espaço propício a tertúlias.

 

Um dia vou achar que estou louco. Vou pensar que sou o único a andar no sentido inverso do mundo. Vou acreditar que tudo aquilo de errado que me acontece é na realidade um problema dos meus olhos e da minha percepção. Hoje é o dia.